Suco detox?! Não engula ilusão. Nenhum suco faz o detox do pé na jaca

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Ainda dá tempo para mais uma promessa de ano-novo? Diga que sim e prometa: nunca mais você vai acreditar que um copo de fruta batida com vegetais será capaz de desintoxicar o seu organismo. Nunca, nunquinha. E cumpra esse juramento. Ah, e pode beber? Até pode. Se lhe agrada, sirva-se. Estará ingerindo vitaminas e minerais, em doses mais ou menos concentradas conforme a técnica de preparo bebida, e isso talvez seja uma boa para aqueles que se recusam a comer uma bela salada.  Bacana e… só.

Talvez se pergunte por que estou fazendo tempestade em um copo de suco. Porque esse líquido verde — quer dizer, em geral ele é verde  — é o exemplo mais bem acabado de como, de gole em gole de informação (ou desinformação),  as pessoas que buscam uma vida saudável acabam sorvendo bobagens. Você não merece.

Nem entro no mérito da motivação de quem as propaga, se há interesse comercial ou uma ingênua falta de embasamento científico. Só penso no equívoco que é, por exemplo, chamar a jaca de pantufa nas festas de final de ano e, daí, achar que tudo se resolve em uma garrafa de suco. Não é bem assim.

A enganação começa descaradamente no nome. Ora, o apelativo detox vem do que seria desintoxicação em inglês. E, repare, o que nos intoxica é sempre — desculpa a obviedade— uma toxina. Se você tivesse experimentado uma comida estragada, entenderia que o efeito de uma toxina não tem absolutamente nada a ver com o empanturramento após uma farra de calorias. Aí, realmente intoxicado, o seu estômago ficaria embrulhado até diante do suquinho tão natural e tão "milagroso"…

Também nunca vi um suco desses dar nomes aos bois.  Toxinas têm nome e sobrenome científico, vamos combinar? Mas entendo: se a pessoa nomeasse o que o "suco detox" desintoxicaria para merecer ser rotulado como tal, ela teria de bancar o discurso, medir o nível da substância no sangue e ver se a bebida — ou a dieta detox ou, sei lá, a cápsula mágica detox —  eliminaria a sua presença no organismo. Não, não há folha de couve que faça a proeza. Nem colher de gengibre ralado capaz dessa façanha. Varri sites acadêmicos, conversei com pesquisadores, não achei uma linha sequer de evidência científica para refrescar.

Sim, o nosso organismo vive às voltas com toxinas ao lidar com a comida e com a bebida, principalmente a alcoólica  e quando você exagera em uma ou em outra — ou, pior, nas duas. Mas não precisa correr até o multiprocessador mais próximo: seu corpo já tem mecanismos suficientes para jogar tudo isso fora. Agora, se você abusa, pode levar um tempo até que ele complete a faxina — está aí a ressaca para provar. Mas, gastando mais ou menos tempo (e você sofrendo com suas demoras), ele faz a limpeza direito. E de graça. Não, o suco que pode ter custado caro não acelera nem dá uma forcinha especial na tarefa.

O seu intestino já barra a maior parte de tudo o que poderia lhe fazer mal. Tanto barra que, quando não dá suas boas-vindas a uma toxina, a partir daquele instante nada mais entra  — nem água. Daí a enxurrada da diarreia ou do vômito. Se mesmo assim algo cair no sangue, logo será deportado pelo fígado. Finalmente, se algo ruim continua escapando, entram em ação os rins, mandando tudo embora com o xixi. Aliás, quer mesmo fazer um favor para o seu corpo nessas horas pós-tudo? Beba muita água, ainda mais após uma festança. Se existe um aspecto em favor de um suco detox é ele ser líquido. E ponto.

Podem existir outras vantagens. Sucos frescos de frutas e vegetais costumam ser carregados — como um prato de salada, volto a comparar — de substâncias antoxidantes e antiinflamatórias.  E isso não tem nada a ver com desintoxicação.

Uma dieta rica em antioxidantes é  bem-vinda em qualquer dia do ano. Afinal, eles combatem os famigerados radicais livres, moléculas instáveis que reagem com qualquer coisa  pela frente e que estão por trás de doenças. Mas, embora as nossas lambanças possam aumentar a produção de radicais, quero dizer que a maior parte se forma quando a gente respira. Cada sopro de ar que mantém a vida contraditoriamente nos mata um pouquinho, fazer o quê! Daí, entenda: se você respira o tempo todo (opa, você respira, certo?), é o consumo regular de vegetais que pode ajudar e não uma dieta de sete dias. à base de suco ou não.

Além disso, caso a dieta do suco se prolongue, ela leva à carência de outros nutrientes que não fazem parte da receita. Como todo líquido, ainda por cima, o suco supostamente detox gera menos saciedade e, para esculhambar de vez,  pode ser carregado de frutose, açúcar que em excesso engorda o fígado. A perda de peso — em geral o que se perde é líquido, diga-se —  nunca se sustenta. E, bem provável, é ela o que você no fundo quer com a desculpa esfarrapada de um detox.

Promessas como as desses sucos provocam a ilusão de que os dias de esbórnia à mesa podem ser compensados sem esforço. Isso é o que me pega. Poucas ideias são mais na contramão de um estilo de vida saudável,  que exige de nós golinhos de empenho e atenção no dia a dia. Pior mesmo é quando falam que contêm ingredientes termogênicos. Isso me dá calor, só que de nervoso.