Quer mesmo um alívio para a enxaqueca? Trate de perder a barriga
O elo entre os pneus na cintura e o suplício existe — e ele não é fraco. Uma barriga avantajada sempre provoca dores, sabia disso? Não me refiro às chibatadas que machucam a autoestima só de vê-la no espelho e, sim, a tormentos sentidos por todo o corpo, como fibromialgia, cólicas e dores de cabeça, principalmente a enxaqueca.
Note que nem estou citando as costas doloridas, castigadas por uma coluna que perdeu a postura ao sustentar alguém pesado. Muito menos falo de articulações esmagadas de tão sobrecarregadas. É verdade que esses problemas são comuns em quem ultrapassou o peso ideal, mas no caso deles há uma relação de causa e efeito nítida. Outras condições dolorosas, porém, surpreendem porque ninguém as associa aos ponteiros da balança. E no entanto…
Um em cada cinco brasileiros padece de dor crônica e um dado é ainda mais sofrido: essa proporção dobra entre aqueles que apresentam uns bons quilos a mais. Por definição, uma dor é rotulada de crônica quando nos maltrata por um período maior do que três meses. Não é como aquele fisgar repentino de pisar em um prego, porque aí, nessa forma aguda, o berro da dor é um aviso bem-vindo: opa, tire o pé daí!
Já a dor crônica, ao contrário, é uma inútil na nossa vida. Ah, eu xingo mesmo… A danada parece só existir para uma criatura sofrer. De um sadismo biológico incrível, sua única função é fazer doer. E depois pinicar, latejar e arder um pouco mais. O excesso de peso apoia esse comportamento cruel, o que até o momento é mais estudado nas enxaquecas, embora a mesma relação possa ocorrer em outros martírios.
Não à toa, os dados no Brasil são de que as crises enxaquecosas aparecem com uma frequência até 50% maior nos obesos — "enxaquecosas", aliás, é um adjetivo feio de doer, credo! Até recentemente, as suspeitas dos cientistas para explicar o fenômeno sempre caíam sobre o prato. Tinham sua lógica: quem está acima do peso geralmente capricha nas porções de comidas gordurosas, embutidos e chocolates, para exemplificar alguns itens da dieta que podem, de fato, servir de gatilho para essas dores de cabeça lancinantes.
Não raro a pessoa gorducha é, ainda por cima, sedentária — e a inatividade física é mais um fator que dispara as crises. Sem contar que a própria enxaqueca deixa suas vítimas estressadas e, bem, o estresse faz muita gente atacar a geladeira…
A pergunta é: quem veio primeiro, a barriga protuberante ou a terrível enxaqueca, com seu típico latejar em um lado só da cabeça, a visão de pontinhos luminosos e a vontade de se trancar num quarto escuro? A neurologista americana Barbara Lee Peterlin, do Centro de Pesquisas sobre Dor de Cabeça da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, diz que tudo se mistura em um emaranhado. Segundo ela, o caminho é de mão dupla.
Depois de analisar as informações de 3 862 americanos, a médica notou que o risco de uma enxaqueca atormentar o dia a dia era 81% maior em quem apresentava um IMC, o índice de massa corporal, acima de 30. Ou seja, um IMC indicando obesidade.
Em uma segunda fase do trabalho, o time da Johns Hopkins demonstrou que, entre os pacientes obesos com enxaqueca que emagreceram graças à cirurgia bariátrica, as crises despencaram de oito vezes para menos de quatro vezes por mês. E o alívio foi proporcionalmente maior naqueles que perderam mais centímetros na cintura. Não deve ser coincidência.
Hoje se sabe que a gordura abdominal pode provocar muitos "ais". É que ela, em especial, produz diversas substâncias inflamatórias, como a famigerada interleucina-6. Quanto mais pneus recheados de banha ali, perto do umbigo, maior essa produção, detonando inflamações pelo corpo.
Qualquer inflamação, por sua vez, estimula a liberação de moléculas mensageiras de dor da cabeça aos pés. Então, imagine: no fim das contas, inflamar-se é sofrer mais por qualquer bobagem. E há uma ação direta no cérebro também. A tal interleucina-6, por exemplo, amplifica a percepção das sensações dolorosas na massa cinzenta. Desse modo, como essas substâncias se encontram em doses aumentadas nos barrigudos , dá para a gente deduzir que, neles, dores como as da enxaqueca tendem a ser mais frequentes e mais intensas.
Emagrecer seria um alívio, só que nunca é imediato. Ainda mais lembrando que, por ironia, alguns remédios usados contra as enxaquecas aumentam a fissura por doces. E a realidade doída é que, na contrapartida, jamais existiu um comprimido que, se tomou, a pança sumiu. Mas vale a pena todo o esforço para derretê-la. Até porque a gordura acumulada na barriga causa tantos problemas graves de saúde que, talvez, entre eles, a enxaqueca seja a menor de suas dores de cabeça.
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