A hora de alinhar os dentes é muito antes dos 5 anos. Talvez com aparelho
A foto de uma criança dormindo com a boquinha aberta me dá aquela vontade de entrar na imagem só pra morder toda aquela fofura. Mas, enquanto eu suspiro um "ownnn", a professora Silvia Chedid dispara um "creeedo!". Referência em odontopediatria no país, doutora em ortodontia e ortopedia funcional dos maxilares, ela ainda completa: "Por que a mãe não fechou a boca desse bebê?!" E fala isso muito a sério, inconformada com as centenas likes nas redes sociais que o pequeno dorminhoco recebe ao sonhar respirando pela boca. Para ela, um pesadelo.
Entenda, a professora tem uma certeza: a idade certa para corrigir os dentes é quando a criança tem, estourando, 5 anos. Quanto mais cedo, melhor, E nunca falta o que corrigir nos chamados respiradores bucais. Ela até já colocou aparelho em muito bebê de 1 ano e meio. É um recurso mais extremo, claro. Antes disso, lança mão de diversos outros: ensina exercícios e massagens no bebê para os pais repetirem em casa e propõe mudanças de hábitos.
Em seus livros para profissionais, que são bestsellers nos cursos de Odontologia, Silvia Chedid defende uma corrente que ganha força: esperar pelos dentes permanentes ou, pior, pela chegada da adolescência para corrigir a dentição com um aparelho é um erro. Isso porque é olhar só para os dentes, quando um sorriso bonito implica em toda uma harmonia entre os ossos da face, com ênfase nos maxilares.
Essa harmonia tem sérias implicações saúde geral: um monte de coisas ruins acontece quando o recém-nascido respira errado. Para início de conversa, ele irá mamar do jeito errado também, engolindo ar. E eis o efeito-cascata. Engolir ar durante as mamadas, por sua vez, é caminho certeiro para cólicas e, daí, muitas noites mal dormidas de choro.
Mas não só isso: as bochechinhas ficam estiradas e isso tensiona as arcadas, que se tornam pouco a pouco mais estreitas. Já o céu da boca é empurrado para cima, ficando alto demais. É como se tudo saísse do lugar —até a língua, mal acomodada, tende a ficar ligeiramente para fora, criando todas as condições para futuros problemas de dicção.
A arcada estreitada ainda leva os dentes de leite a nascerem desalinhados. E, para toda essa boca em desarranjo, engolir alimentos mais duros será um tanto difícil. Pronto: terreno preparado para dificuldades alimentares, como uma predileção por tudo o que for mais pastoso, que tornarão as coisas cada vez mais complicadas — e os problemas nas arcadas, maiores. Cresce a bola de neve.
Como se fosse pouco, a tendência de um respirador bucal é pender a cabeça um pouco para a frente, porque o eixo do seu corpo se torna diferente. Isso, além de provocar dores de cabeça, desalinha vértebra após vértebra da coluna, em um efeito-dominó. O menino ou a menina pode terminar até mesmo pisando errado, no final dessa cadeia que começa na boca, quem diria!
Às vezes, porém, a encrenca toda se inicia na barriga da mãe, antes mesmo de o bebê tragar o ar — pela boca ou pelo nariz. Por isso, para evitar de problemas digestivos a posturais, de dores de cabeça a distúrbios do sono, um conselho é reparar na própria família, se alguém tem queixo um pouco para frente ou muito para trás ou, quem sabe, se um dos pais é ligeiramente dentuço ou se já foi, antes de usar aparelho na juventude. Pelos exames de ultrassom, os especialistas em ortopedia dos maxilares conseguem antecipar se o pequeno herdou um desses traços. E, aí, eles começam a ser corrigidos no berçário.
O aleitamento no peito, claro, é muito bem-vindo. Exercita a musculatura para ajustar os ossos faciais e, principalmente, obriga a criança a respirar do jeito certo, pelo nariz. Mas, quando a ela passar para o cadeirão, será a hora de ensiná-la a mastigar. Isso mesmo. Segundo a professora Silvia Chedid, ninguém nasce sabendo esse tipo de coisa.
Repare: se a mãe dá um pedaço de pão ou de cenoura para o filho, o certo seria ele cortar o alimento com os dentinhos da frente, que estão lá para isso. Se o bebê rasga a comida meio de lado, com os caninos, está tudo errado. Idem, se mastiga de um lado só, sem a linguinha ficar passeando — e empurrando o bocado de alimento — da direita para esquerda e da esquerda para direita.
Tudo isso vai tirando os dentinhos que mal estão aparecendo do lugar. E como a dentição de leite serve de guia para a permanente, ela romperá anos depois já toda desalinhada.
Sobre o bebezinho dormindo de boca aberta a ordem é, ao notar isso, ir até o berço e fechá-la com delicadeza. Mil vezes se for preciso. Até que ele aprenda. E ele aprende. Não sem antes dar uma canseira, mas que valerá a pena. Provavelmente você não terá um adolescente de sorriso metálico no futuro — e, se tiver, tudo será mais fácil de resolver. Tão ou mais importante, seu filho será mais saudável da boca aos pés, sem cólicas nem outras dores.
Daqui pra frente, já sei: meu "ownnn" e meus "likes" irão para dorminhocos flagrados com toda a sua irresistível fofura, mas de bico bem fechado.
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