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Blog da Lúcia Helena

Sorte da nossa saúde: todo tempo agora é tempo de tâmaras

Lúcia Helena

06/12/2018 04h00

Crédito: iStock

Sempre achei sabor nas esperas. Lembro do meu pai anunciando que estava chegando a época de pêssegos ou de morangos, que hoje a gente encontra na feira da esquina de janeiro a janeiro. De certa maneira, é uma pena essa perda do tempo das coisas. E uma espera boa demais, que me deixava salivando, era pela noite de Natal quando, feito joia, minha família abria uma caixinha de tâmaras doces como mel. Mal dava uma para cada um. Confesso que ultimamente vinha sentindo um pouco de birra ao encontrar a fruta do deserto sempre por aí. Qual a graça? Mas hoje até mordo a língua.

Há pouco, pesquisadores americanos da Michigan State University ao lado de cientistas árabes da  King Saud University analisaram — in vitro, é verdade — as 29 variedades do fruto da tamareira. E todas elas deram show como um potente anti-inflamatório. O colesterol? Perto da incrível combinação de antioxidantes da tâmara mostrou-se pouco afeito a formar placas. Assim como substâncias envolvidas em inflamações pelo corpo inteiro diminuíram drasticamente.

Os pesquisadores também testaram os componentes da fruta em culturas de células de diversos tipos de tumor. Mas nesse caso lamento: a tâmara não sustentou a fama que tem lá pelas badas do Oriente de evitar o câncer. As células malignas continuaram se multiplicando de boa. Mesmo assim, ponto para os seus anti-inflamatórios naturais.

Fui checar a história com a nutricionista Vanderlí Marchiori, de São Paulo. E ela, claro, não caiu de surpresa como eu. Falou até da existência de estudos em que as proantocianidinas das tâmaras— dando nome às moléculas —, substâncias que são um dos subgrupos das antocianinas encontradas no açaí, ganharam do resveratrol das uvas na redução do risco cardiovascular.

Por trás dessa coleção de nomes difíceis, a moral é: a pressão arterial ficou mais controlada e os níveis de colesterol caíram mais. Tudo bem, ainda são poucos estudos relacionado diretamente as tâmaras e a saúde do coração, mas que tem coisa boa ali, ah, tem. E não só em matéria de fitoquímicos.

A quantidade de potássio é de fazer inveja à banana: em 100 gramas, as tâmaras têm cerca de duas vezes e meia mais do mineral. Mas, opa, 100 gramas? Menos, menos… Ora, tanta doçura não vem do nada — vem de uma quantidade generosa de frutose, melhor maneirar…

Vanderlí Marchori dá a porção ideal: 50 gramas, algo como quatro ou cinco tâmaras por dia, no máximo.  É o suficiente para abastecer o organismo de 12% de sua necessidade diária de fibras. E, claro, ganhar de brinde o potássio, os fitoquímicos, um tanto considerável de ferro e muito ácido fólico, sendo um bom petisco para mulheres que planejam engravidar por isso mesmo. Ah, sim, sem a gente se esquecer da energia da frutose.

A concentração de frutose tem levado muita gente do mundo fit a usar tâmaras no lugar do velho açúcar em receitas de brownies, docinhos, bolos… Perguntei à Vanderlí se valia a pena essa troca e ouvi que sim: "Porque junto com a frutose vem todo o resto e as fibras retardam a absorção desse açúcar", ela me justificou. Mesmo assim, fez questão de ponderar: "Tâmaras não são boas pedidas para diabéticos que não contam direito a quantidade de carboidratos que consomem".

Já para quem pratica esporte e não é diabético, as tâmaras são uma excelente escolha, justamente pelo combo de frutose e minerais. E, por serem secas, talvez representem uma opção mais fácil de levar para cima e para baixo, na academia, no clube ou no parque. Também merece espaço no lanche saudável  de qualquer um de nós de vez em quando, como naquele mix de castanhas e frutas secas, por que não?

Citadas como símbolos de prosperidade em três livros sagrados — na Bíblia, no Alcorão e no Torá —, mesmo que não sejam servidas feito joias como na minha infância, merecem que você deguste sua doçura com respeito. Fique sabendo que, no passado, as tamareiras levavam 100 anos até darem frutos. Daí a frase: quem planta tâmara não colhe tâmara. Ou seja, deixa a delícia para as gerações futuras.

Em outro papo, com a empresária Julia di Biase, da Date Crown —  que importa dos Emirados Árabes duas variedades mais carnudas de tâmaras que só agora, para o nosso deleite, começam a ser degustadas no Brasil —, descobri que, com a tecnologia, a demora para colher os primeiros frutos dessa palmeira do deserto passou a ser "só" de uns trinta anos.  Só?! É tempo de montão…

Portanto, ainda que estejam diante de nós o ano inteiro, as tâmaras carregam as esperas em si. Melhor não comer com pressa o que a natureza esperou décadas para nos oferecer.

Sobre o autor

Lúcia Helena de Oliveira é uma jornalista apaixonada por saúde, assunto sobre o qual escreve há mais de três décadas, com cursos de especialização no Brasil e no exterior. Dirigiu por 17 anos a revista SAÚDE, na Editora Abril, editou 38 livros de autores médicos para o público leigo e, recentemente, criou a Vitamina, uma agência para produzir conteúdo e outras iniciativas nas áreas de medicina, alimentação e atividade física.

Sobre o blog

Se há uma coisa que a Lúcia Helena adora fazer é traduzir os mais complicados conceitos da ciência da saúde, de um jeito muito leve sem deixar de ser profundo, às vezes divertido, para qualquer um entender e se situar. E é o que faz aqui, duas vezes por semana, sempre de olho no assunto que está todo mundo comentando, nos novos achados dos pesquisadores, nas inevitáveis polêmicas e, claro, nas tendências do movimentadíssimo universo saudável.