11 coisas que prometeram mudar a sua saúde e que não mudaram bulhufas
A lista é marota. Coloca na mesma tigela ingredientes que são estudados e que têm lá seus pontos positivos e outros que não passam disparates que a gente andou engolindo. Mistura tudo. Em comum, cada um deles já foi apontado por fazer toda a diferença em nossas vidas. Espantariam nossos problemas em cada gole ou mordida. E, claro, afinariam a cintura, que é a promessa de sempre. Mas cá estamos, do mesmo jeitinho.
"Até porque alimentos que anunciam milagres não fazem ninguém assumir um novo comportamento alimentar", resume a nutricionista Luciana Lancha, do IBES (Instituto de Bem-Estar e Saúde) em São Paulo, onde faz um trabalho espetacular na contramão dessas crenças todas. "A pessoa faz tudo errado, leva a mesma rotina estressante de antes, continua sedentária, mas acha que o.k., que tudo vai mudar só porque está comendo chia." Sem contar que, na prática, nenhum item isolado faz tudo o que promete em teoria. É diferente de botar fé na dieta mediterrânea, que combina um monte de coisas sem apostar as fichas só no azeite, por exemplo. Quando algo, por si, promete salvar a pátria, ai, ai…
1. Chá verde: não cabem tantos benefícios na xícara
A infusão feita com as folhas da Camellia sinensis é milenar nas bandas do Oriente. Por aqui, ganhou espaço nos empórios naturalistas no final dos anos 1990 e, há cerca de dez anos, difundida de vez entre nós, virou febre dos saudáveis, indo parar em qualquer supermercado de esquina.
O chá verde é mesmo um dos campeões em polifenóis, antioxidantes que mostraram, em laboratório, proteger o coração, melhorar a ação da insulina, afastar o câncer e, pra variar, emagrecer. Se tudo isso coubesse em uma xícara…Você teria de tomar de cinco a sete xícaras diárias para seu organismo sentir alguma diferença. Algo que — começa por aí — já não é para todo mundo.
O coração, que ironicamente você quer tanto proteger, pode não se dar bem com o exagero. E, depois do anoitecer, bebericar chá verde é mandar pra longe o sono e criar o clima ideal para o estresse. Também não espere praticidade. Não é qualquer chá verde de sachê que concentra tantos polifenóis como aqueles a granel e made in Japan usados nas pesquisas.
Deixar o seu litro diário pronto? Há controvérsia: após o preparo, seus benditos antioxidantes tendem a despencar. O certo seria beber na hora. Chá verde de latinha? Esqueça também. Boa parte dos princípios ativos já foi para o brejo, sem contar o açúcar e os conservantes.
2. Se a quinoa ajudasse tanto, um prato de arroz com feijão resolveria a nossa vida
Que bom que a semente dos Andes peruanos desembarcou por aqui há uma década. Cheia de zinco, cálcio e ferro, seu grande mérito está na proteína — menos pela quantidade e mais por reunir tipinhos que são pau para toda obra dentro do organismo. Mas façamos uma bela justiça a uma dupla que é prata da casa: entre os componentes da quinoa, os que se destacam são justamente a lisina e a metionina, os dois aminoácidos presentes no arroz com feijão. Os mesmíssimos, sem tirar nem por.
Moral : a quinoa é apenas uma opção a mais. E, se já ouviu sua fama de aumentar a saciedade e facilitar a dieta, pense: qualquer alimento cheio de proteínas faz isso, ainda mais quando a origem é vegetal, porque aí também oferece fibras. Portanto, por que a quinoa mudaria a nossa vida?
3. Óleo de coco é pior do que banha de porco
Este é quase um caso de seita, com milhares de adoradores desse óleo do capeta. Composto de 82% de puríssima gordura saturada, passa a perna na banha de porco no potencial para entupir as artérias.
Nos Estados Unidos, a American Heart Association já se debruçou sobre 139 estudos e tomou uma posição: não viu vantagem alguma no consumo regular desse óleo na cozinha. Ao contrário, observou a disparada do colesterol ruim. No Brasil, pelo menos três sociedades médicas seguiram o mesmo caminho. Mas o povo insiste que é bobagem. Bem, aqui a voz do povo não é a de Deus.
O que eu adoro mesmo é ouvir que o óleo de coco ao menos é natural, como se a banha e a manteiga fossem criações de laboratório e as olivas não nascessem das oliveiras. Cruz credo, é a seita do óleo de coco!
4. Desde quando a gente come ração?!
Desde que uma estudante de naturopatia do Paraná, em busca de uma alimentação supostamente equilibrada, misturou tudo o que encontrou pela frente: açúcar mascavo, cacau em pó, aveia, farelo de trigo, fubá e mais uma dezena de itens. Trocou o bife e a salada pela gororoba e, passados seis meses, alegou ter perdido quase 40 quilos.
A mistura, dita ração (ui!), era extremamente calórica. Pesava no estômago e, com o tempo, enjoava. Portanto, a tigela da tal ração humana ia ficando menor, até embrulhar o apetite e a pessoa perder peso por fechar a boca mesmo. Aliás, ela nunca oferecia todos os nutrientes de que o corpo precisava para substituir uma refeição. Até que no ano de 2011, quando estava no auge das vendas, a Anvisa acabou com a festa. Minha opinião: a proibição não foi cachorrada.
5. A chia faz o que a aveia já fazia
Nativa do México, a semente dessa erva aparentada com o alecrim e a sálvia tem de fato inúmeras qualidades. Duas colheres de sopa já oferecem potássio equivalente a meia banana e cálcio comparável a meio copo de leite. É cheia de ômega-3, a mesma gordura dos peixes de água fria. Mas não foi por causa desses predicativos que a chia abriu o apetite do brasileiro e, sim, pela fama (de novo!) de ajudar no emagrecimento.
Ajuda mesmo? Pode ser, na medida em que provoca a sensação de saciedade. E isso porque suas fibras, dentro do aparelho digestivo, formam um gel — geleca que dá aquela sensação de barriga cheia ao longo do dia, evitando ataques de gula. Só que a aveia, antiga entre nós, já tinha o mesmo efeito. Venderam a chia como se oferecesse algo muito diferente. E assim continuamos com a vida de sempre.
6. Detox: nada mais do que um copo de vitaminas e sais minerais
Esses sucos detox são pura ilusão. Quer dar uns goles de vitaminas e sais minerais? Fique à vontade! Os nutrientes de vegetais fresquinhos só podem fazer bem. Mas, se acreditar em mais alguma vantagem além dessa, estará sorvendo bobagens.
O descaramento do suco começa no nome: o que desintoxica nos livra, ao pé da letra, de uma toxina. Ora, nenhum suco faz a proeza. Almoce uma comida estragada, beba de guti-guti um copo de suco verde e verá.
Claro, o nosso organismo vive obrigado a enfrentar toxinas. Mas já tem, "de fábrica", mecanismos suficientes para eliminar essas substâncias, sem você ter de recorrer do liquidificador.
7. Gojy berry é um punhado de fibras, vitaminas e carotenoides
É uma fruta de origem chinesa. Pessoalmente, acho que merece mais elogios pela composição nutricional do que pelo sabor da versão desidratada encontrada pelo país.
É abundante em vitamina C. Daí a fama de afastar infecções, graças ao mesmo poder da laranja, do limão, da tangerina e de tantos outros frutos que sempre deram por aqui. Tem, é verdade, o dobro de carotenoides da cenoura para proteger a visão. E ajudaria a emagrecer não por um passe de mágica, mas porque tem fibras e um baixo índice glicêmico. Mas você sempre pode obter benefícios idênticos na sua fruteira tupiniquim.
8. Lamento, mas chá de hibisco não chapa a barriga
Há uns dois anos, o líquido vermelho e de sabor avinagrado era onipresente nas garrafinhas da turma que corria atrás de uma barriga tanquinho. Tenho a impressão de que mais essa onda está caindo.
O que se sabe pra valer: seu ácido málico tem um bom efeito sobre o fígado. E, sim, você pode até afinar a cintura em um primeiro momento, mas porque o hibisco é um ótimo diurético. Portanto, se chegou para mudar a sua vida, foi no sentido de levar você a fazer mais xixi — e só.
9. Fazer jejum intermitente é para os fracos
A história toda surgiu com o Ramadã, o mês de renovação da fé e da caridade no Islamismo, em que só se pode comer quando o Sol se põe. Pois bem: notou-se que muito muçulmano obeso perdia peso e melhorava a glicemia nesse período."Isso acontecia apenas por causa da redução calórica", afirma , chamando à razão, Antonio Herbert Lancha Júnior, professor titular de Nutrição da Universidade de São Paulo.
E nem só de Ramadã vivem os próprios muçulmanos. O que quero dizer: ninguém aguenta passar os dias com períodos prolongados de jejum. Não me espanta o que o professor Lancha Júnior contou ao blog. No maior estudo sobre o tema, publicado no JAMA, simplesmente metade — metade! — dos participantes pulou fora antes do final. Sorte deles."Durante o jejum, o organismo produz muito cortisol e, se isso acontece um dia após o outro, perdemos massa magra." Repito: jejum é coisa de gente fraca. Ou que ficará fraca. Sem contar que favorece uma resistência à insulina, capaz de levar ao diabetes.
10. Tirar glúten e lactose sem necessidade sai caro
Caro até ao pé da letra. A indústria logo tirou proveito e criou linhas para atender ao público que fechou a cara para as duas substâncias e que paga a mais por isso. No entanto, não faz sentido atribuir à proteína do trigo a capacidade de engordar — gente, é uma proteína, está bem? Nem dizer que o mundo inteiro se tornou, da noite para o dia, intolerante à lactose, cuja enzima responsável pela digestão diminuiu com a idade, mas nunca zera — sendo que até agora a humanidade tomou leite, comeu queijo e bolo da vovó (com lactose e glúten!), passando bem.
"São modismos ", diz ao blog a professora Olga Amâncio, presidente da SBAN ( Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição). "Ou seja, mudanças no comportamento alimentar adotadas entusiasticamente pelos seus adeptos, que aceitam a ideia de virtudes especiais em determinados alimentos ou de eliminar o que seria nocivo". Nocivo na imaginação dessa gente, bem entendido. Quando ouve dizer que pão engorda, por exemplo, a professora reage: "Quem engorda somos nós. É só saber se relacionar com ele. Afinal, um pão na chapa na padoca, de vez em quando, faz bem até pra alma."
11. Água com limão, só se for com gratidão
Gisele Bündchen, sua linda, não me venha com essa — até, tu?! –, dizendo que esse é o seu segredo. Se eu tomasse um jarro de água com limão em cada amanhecer, não viraria você. A água azeda bota o metabolismo pra acordar? Nem sabia que ele dormia. Só sei que qualquer líquido fará bem depois de horas adormecidas sem a gente beber nada, reidratando o organismo. E tudo o que cair no estômago, depois de o corpo despertar, colocará o aparelho digestivo inteiro para se movimentar.
Será que a acidez da água em jejum mudaria o pH do corpo?? Tem essa também?! Não encontrei um único estudo sério sequer a respeito, embora eu possa falar maravilhas do limão e mais até pela casca com seu limoneno que, coitado, provavelmente vai parar na lixeira da turminha da água.
Só posso achar que o que funciona é beber com gratidão. Aliás, como eu preciso perder uns quilos, deixo aqui: gratidão!
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