Por que a maré saudável está boa para os peixes selvagens do Alasca

Crédito: iStock
Alabote, black cod, polaca selvagem, cod selvagem e, por último o mais famoso, salmão selvagem — ou será que devo dizer salmões, já que, das cinco espécies nativas do Alasca, o vermelho ou sockeye, o keta e o pink, estas três já se encontram entre nós? Aposto: se ainda não costumamos pedi-los nas peixarias, talvez isso mude por um conjunto de fatores que são prato cheio para quem busca uma alimentação saudável. A começar pelo lugar onde vivem e pela forma como são pescados.
Dos 50 estados unidos no território americano, o Alasca é o mais gigante. Você precisaria juntar uma Califórnia, um Texas e, de quebra, Montana para obter a vastidão gelada do Alasca. No entanto, até por ser um gelo, é a região menos povoada dos Estados Unidos, com uma densidade populacional de um único habitante humano (urso não vale!) a cada 420 metros quadrados. Temos de reconhecer: a nossa ausência ajuda a manter os mares limpos. E, neles, nadam muitos peixes, que, se depender do governo local e do federal, não sumirão do mapa só para satisfazer o nosso apetite.
"Há um controle quádruplo para que a população de pescados jamais fique ameaçada", conta a nutricionista Andréa Esquivel, citando o exemplo dos salmões selvagens, que nascem em rios límpidos, migram para o mar e, depois, voltam para a água doce, ou melhor, para o mesmíssimo lugar onde nasceram para desovar. Logo depois, morrem. Missão cumprida.
Na medida em que sobem o rio— piracema, eis a palavra que os nossos índios ensinariam aos esquimós — ou em que os jovens salmões viajam para o mar, sonares de alta tecnologia já começam contá-los, um por um. Por segurança máxima, radares fazem a checagem, vai que.… Sobrevoando o local, helicópteros também observam tudo. E, nas águas, biólogos ficam nas proximidades dos pontos onde os peixes pulam para vencer a correnteza — pirapora! —, realizando uma última contagem, esta bem visual. "Assim, cruzando as informações, há uma ideia do saldo de peixes e do quanto será viável pescar naquele ano", conta Andréa.
Ah, nem dá para pescá-los a qualquer momento. "Conforme o número em uma região, vão existir até mesmo dia e horário específicos para a captura. Toca a sirene, deu a largada. Chegou o horário-limite? A sirene então ressoa e os pescadores que se contentem com o que conseguiram." Simples assim.
Hoje, a nutricionista — professora convidada de diversas universidades, com a USP de Ribeirão Preto — presta consultoria técnica para o Alaska Seafood Marketing Institute (ASMI), uma parceria entre a indústria pesqueira local e o governo americano para promover os peixes e os crustáceos que vêm dos mares, óbvio, do Alasca.
A entidade desembarcou aqui sem pressa, ainda em 2011. E hoje, dizem, já é possível encontrar seus pescados congelados em qualquer região do Brasil, comercializados por grandes indústrias, mas — repare — sempre com o selo da ASMI. "Ele é que garante a procedência e, lógico, todo esse cuidado", diz Andréa Esquivel.
Não é só a sustentabilidade que justificaria a escolha — embora ela seja um tempero cada vez mais apreciado à mesa. Existe a questão nutricional. Fontes incríveis de vitamina D e B12 mais uma série de minerais, os peixes selvagens têm sempre muito ômega-3, ácido graxo cada vez mais valorizado por afastar doenças, proteger especialmente os nossos vasos e, acima de tudo, manter o cérebro em bom estado. Em tempos nos quais a memória preservada vale ouro, não se pode desperdiçar uma gota de ômega-3.
"Uma porção de 85 gramas de qualquer salmão selvagem do Alasca tem perto de 1.700 miligramas dessa gordura, quase o dobro do que precisamos obter na dieta", exemplifica Andréa Esquivel. "E é um ômega com altíssima biodisponibilidade, isto é, que o nosso organismo aproveita bem, diferentemente daquele ômega das cápsulas." Mas como ficariam aqueles salmões criados em cativeiro?
Se você pensar em quantidade de gordura, eles ganham disparado: 20% de sua composição corporal é gordura pura, contra os 5% ou 7% de um salmão selvagem. Mais leve, este é desafiador na cozinha se não há orientação, porque pode sair de uma assadeira muito seco. Note o coradíssimo salmão pink da foto ao alto: ele não tem aquela gordura branca entremeada na carne. "Feito todo salmão selvagem, ele é um atleta, sempre nadando contra a correnteza. Já o peixe de cativeiro é um sedentário, que vive recebendo comida enquanto mal pode se mexer no tanque que divide com mais uns 4 mil companheiros", compara Andréa Esquivel. É um peixe, diria, com obesidade.
O ômega-3, vale eu contar, é uma gordura que não endurece em baixíssimas temperaturas. E o certo, certo na mamãe natureza é ela parar na superfície do corpo — em vez de formar filetes na carne —, servindo de isolante térmico. Na prática, isso significa que, num peixe de água fria nadando livre e solto, esse ácido graxo está pra valer na pele. "Por isso, é errado descartá-la na refeição", ensina a nutricionista.
No peixe de cativeiro, a fonte de ômega costuma ser vegetal — a ração contém linhaça. Sem dúvida, há ômega nessa alimentação, mas o que sobra no nosso prato nem sempre são frações que o corpo aproveita tão bem. A dieta do cativeiro também não deixa os peixes criados ali com cor de… salmão! Daí recebem corantes. Por trás do tom, quando ele é natural, há a astaxantina, um dos maiores antioxidantes obtidos por meio da dieta, proveniente de crustáceos, como os pequeníssimos krills com os quais os tipos selvagens fazem a festa. Outro ponto: no cativeiro, segundo Andréa Esquivel, são derramados antibióticos. Ora, se um único peixinho ali dentro adoece, leva embora fácil os outros milhares de confinados. Já era.
No caso dos peixes do Alasca, a documentação declara que eles tiraram, em centenas de amostragens, dez no boletim. Ou melhor, zero para pesticidas, arsênico, cádmio, mercúrio e outros contaminantes pesquisados. Amargando, aqui no nosso Atlântico, o maior desastre ambiental da história, com óleo manchando o nosso litoral, é caso de lançar um olho gordo ao norte do planeta. "O problema nem é a mancha, mas o óleo fino e transparente desprendido dela, que — este, sim — deverá contaminar as espécies", avisa Andréa.
Para quem não quer apelar para os importados e está com medo de comprar pescados, a alternativa seria consumir espécies de rios, como a truta e o saint peter, ou dos mares de São Paulo para baixo, como a pescada do sul. "Já quem gosta de camarão, nesse caso específico, deve escolher o de cativeiro", ensina Andréa.
Também vale demais aproveitar a maré favorável do Alasca, agora que os preços caíram. A polaca, por exemplo, é bastante acessível por uma razão simples: ela representa 60% dos peixes do Mar de Bering. Dá e sobra. Aparentada do bacalhau, mas com um sabor suave, sua carne é firme. O cuidado aqui é com polacas que vêm da China — criadas em cativeiro, sem controle das condições desses tanques por lá, essas chinesas são outra história.
Já o alabote ou halibut é um peixe engraçado, que vive enterrado na areia, a ponto de um dos olhos, que seria o do lado soterrado, migrar com o tempo até ficar do ladinho do outro. Esqueça esse visual esquisito e aproveite o sabor quase adocicado, que lembra o do linguado. O desafio é o tempo de preparo de sua carne um tanto magra: se cozinhar demais, ela desmancha. Se assar demais, ficará seca.
O black cod engana. Apesar do nome (cod, em inglês, é bacalhau), de bacalhau ele não tem nada. Lotado de ômega-3, seu sabor é quase amanteigado por causa dele. E, claro, existe ainda o bacalhau selvagem, bacalhau digno do nome. "Como todos, salmões incluídos, têm períodos de pesca diferentes, nunca são encontrados no mercado na mesma época", explica Andréa. Pense bem: pode ser até saboroso experimentar cada um deles em seu tempo.
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