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Prepare-se para fazer sexo até não poder mais, aos 70, aos 80, aos 90 anos…

Lúcia Helena

27/08/2019 04h00

Crédito: iStock

Vida longa ao rala-e-rola! É o que parecem desejar os especialistas em Medicina sexual em suas animadas palestras durante o XXXVII Congresso Brasileiro de Urologia, que termina nesta terça em Curitiba, no Paraná. Nenhum outro assunto rendeu tanta discussão entre eles do que o sexo na terceira idade. Os cientistas enxergam longe. Para eles, agora, a farra entre lençóis aos 60 e poucos anos é quase um namoro de adolescentes. Querem mais é saber, diante de uma população mundial que envelhece, como ficará o bem-bom lá na frente, na sétima, na oitava década de vida adiante.

Quer a notícia boa ou a não tão boa primeiro? Nem uma, nem outra. Vou começar aqui reproduzindo o pito que, em tom de graça, o urologista Eduardo de Paula Miranda, da Universidade Federal do Ceará, deu nos colegas que assistiam à sua apresentação sobre a fisiologia do envelhecimento sexual: "Minha gente, chega de 'idadismo'!", em uma livre tradução dele para o termo ageism em inglês, já usado até pela Organização Mundial de Saúde para designar o preconceito que as pessoas têm em relação a quem é mais velho. E um dos mais arraigados é achar que existe idade para se desinteressar por sexo. Tanto que os médicos mal abordam o tema com esse paciente, a não ser que seja o próprio senhor fogoso puxando a conversa por alguma disfunção capaz de deixá-lo cabisbaixo. 

Sejamos crescidinhos para encarar: meninos e meninas, vovô e vovó gostam da coisa. Ô, se gostam… Digo mais: eles fazem a coisa. Ô, se fazem… Pesquisa de fora, realizada no início dos anos 2000 e mencionada por Eduardo Miranda em sua aula, mostrava que 60% dos casais com mais de 70 anos faziam sexo com regularidade e 41% das parcerias afetivas na faixa dos 80. Que regularidade seria essa? A resposta sincera: sei lá. Os médicos tampouco sabem precisar. Para uns, sexo uma vez por semana. Para outros, sexo uma vez por mês. Devemos alinhar expectativas: fato inexorável é que envelhecemos. E fazer sexo está nesse pacote. A começar pelo brinquedo que nossos corpos carregam para a hora da diversão: os genitais, que mudam. Ô, se mudam…

"Com o tempo, há uma piora natural da função sexual. A ejaculação, por exemplo, já não tem a mesma pressão", diz o doutor Miranda. "E muita gente fica preocupada à toa achando que isso e mais aquilo são uma doença. Bem, só são uma doença quando a piora de qualquer um dos aspectos fisiológicos é muito exagerada." E quando será que é uma coisa e quando será que é outra? Boa pergunta! Ora, tem gente que, digamos, não funciona muito bem, mas que está serelepe na sua vida sexual. "Se eu olhar para um livro de Medicina, direi: 'você tem uma disfunção'. Mas, se a pessoa está feliz, em matéria de saúde sexual eu não posso apontar aquilo como doença, entende?". Entendi perfeitamente. Cada um é cada um, tanto que existe também quem está acima da média para a sua idade, mas que vive de saudade na hora agá.

Nas senhoras cheias de amor para dar, a derrocada já esperada dos seus hormônios sexuais — e não só isso — faz os grandes lábios em sua intimidade tornaram-se pequenos e os pequenos lábios virarem minúsculos, retraídos como quem não quer conversa na cama. E não fiquemos apenas nas aparências dos genitais femininos: as mulheres ressecam, precisam repor a lubrificação perdida para a dor não substituir o prazer e os seus odores clássicos não viraram uma inhaca pelo acúmulo de células descamadas. Mas isso — Freud, não nos inveje! — é fácil de resolver. Há hidratante vaginal em cada farmácia de esquina. 

Nos senhores cheios de amor para dar, ah, o pênis também envelhece. Muda até de cor e fica mais pálido, pelas alterações normais de sua circulação. Não há fonte da juventude capaz de resolver essa e outras mudanças se ele mergulhar de cabeça. Enquanto o equipamento feminino relaxa e goza, o masculino precisa de certa força.  Força muscular mesmo. E como a musculatura peniana perde massa — é a vida… —, a ejaculação que um dia foi um jato potente vira quase uma cuspinha ressabiada. Mas ninguém aqui vai querer fazer competição de sêmen à distância. 

O importante é saber que a contração muscular enfraquecida contribui para uma mudança mais ressentida: os orgasmos se tornam menos intensos e de menor duração.  Nas mulheres, a perda de tônus na musculatura pélvica pode dar na mesma. Mas, embora mais curtos e suaves, ainda são orgasmos — alguém aí vai desprezar um único orgasmo?!

No caso dos homens, a cabeça madura — aquela em cima do pescoço — , vê diminuir a produção de neurotransmissores essenciais para o desejo na região cerebral do hipotálamo, desacelerando toda a reação em cadeia que surge a partir disso e que leva à excitação. E na cabeça madura — a outra, abaixo do pescoço — diminui o número dos receptores capazes de corresponder à situação. O caminho, aliás, é de ida e volta: se alguém encostar a mão ali, a língua ou o que for, o cérebro vai demorar um tantinho mais para sentir o carinho. "A resposta fica mais lenta. É preciso muito mais estímulo do que antes para obter o mesmo resultado", explica o doutor Eduardo Miranda. 

Portanto, parceiras ou parceiros daqueles senhores donos de cabeças maduras, mãos à obra nas preliminares. Informações assim entram na receita do que a Medicina moderníssima está chamando de adaptação sexual do idoso. Não encane com o nome — vá fundo nessa.

Como é sabido, a ereção dos atletas sexuais sêniores já não aponta o teto e, fato, nunca mais será tão rígida. É mole? Nem tanto. "Acontece que o pênis passa a acumular colágeno e se torna menos elástico", descreve o médico. Só que essa rigidez específica não é bacana, porque não abre o espaço necessário para o aporte do sangue que preenche tudo de… alegria. Parênteses: não há comprimido que resolva se não há tanto espaço para o sangue entrar, 'tá?  Mas quem já chegou lá se vira muito bem. Na sua apresentação, Eduardo Miranda contou que, por volta da sétima ou oitava década de vida, parceiros e parceiras satisfeitos se tornam fãs (ou ainda mais fãs)  do sexo oral e da masturbação a dois. Sábios, não ficam chorando as pitangas por uma ou outra penetração frustrada, como muitos casais mais jovens.

Outra coisa: o esforço masculino pelo prazer é tão grande que a natureza criou o período refratário, aquele descanso entre uma transa e outra. De breves instantes no auge da adolescência, ele passa a ser de, em média, 24 horas a partir dos 60 ou 70 anos. Varia de indivíduo para indivíduo e existem até aqueles que carecem de uma semana inteira entre um bom sexo e outro delicioso sexo. É normal? Pode ser. Cada tempo tem seus tempos.

Uma preocupação é com eventuais placas de gordura pelos vasos do pênis. "Se as artérias do coração podem ser obstruídas por elas, imagine então a do pênis, que tem um terço do diâmetro! Ela pode ficar entupida bem antes de uma coronária manifestar qualquer problema", diz ele.  Aliás, se quer saber o que pode turbinar a vida sexual depois dos 60 seria tudo aquilo que faz bem ao coração. Fica a dica. Abandonar o sedentarismo mesmo que tardiamente, ter uma dieta equilibrada, afastar o estresse e controlar a saúde cardiovascular — apegue-se ao "vascular" e lembre-se que a irrigação dos genitais é que faz a nossa festa.

Quem afasta a obesidade não só mantém esses vasos sanguíneos em melhor estado, como preserva mais hormônios sexuais e, no caso dos homens, até evita uma impressão não tão legal de que seu pênis diminuiu de tamanho — na verdade, ele continua o mesmo em matéria de centímetros, mas fica parcialmente engolido pela capa de gordura, o que não é lá muito excitante.

E cuidado com o diabetes! Tanto em homens quanto em mulheres, ele é o maior desmancha-prazeres. "Essa doença ataca em todas as frentes: diminui a sensibilidade dos nervos nos genitais, bagunça a dança hormonal, atrapalha a circulação por todo o corpo", avisa Eduardo Miranda.

O principal recado que a Medicina sexual quer passar é que pessoas mais velhas precisam ter maior liberdade para falar do assunto e para fazer mais sexo. E, claro, gente de todas as idades deve eliminar tabus, dando condições para que os idosos tenham vida sexual ativa até quando bem desejarem. Curioso, no evento foi discutido que as casas de repouso, lá fora, começam a criar espaços mais confortáveis para encontros amorosos, por que não? Não cheguei lá, mas me animo com essa visão de futuro. E não é que eu pense só naquilo — 'tá de sacanagem comigo? Fique sabendo que diversos estudos apontam que uma boa vida sexual garante maior disposição física e mental na idade avançada, incluindo significativa melhora até na parte cognitiva. Sexo, senhoras e senhores, é saúde sem prazo de validade. Ô, se é…

Aviso: em nome da transparência, quero contar que viajei para acompanhar o Congresso Brasileiro de Urologia a convite da Bayer, com total liberdade para cobrir qualquer tema, sem conflito de interesses.

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Sobre o autor

Lúcia Helena de Oliveira é uma jornalista apaixonada por saúde, assunto sobre o qual escreve há mais de três décadas, com cursos de especialização no Brasil e no exterior. Dirigiu por 17 anos a revista SAÚDE, na Editora Abril, editou 38 livros de autores médicos para o público leigo e, recentemente, criou a Vitamina, uma agência para produzir conteúdo e outras iniciativas nas áreas de medicina, alimentação e atividade física.

Sobre o blog

Se há uma coisa que a Lúcia Helena adora fazer é traduzir os mais complicados conceitos da ciência da saúde, de um jeito muito leve sem deixar de ser profundo, às vezes divertido, para qualquer um entender e se situar. E é o que faz aqui, duas vezes por semana, sempre de olho no assunto que está todo mundo comentando, nos novos achados dos pesquisadores, nas inevitáveis polêmicas e, claro, nas tendências do movimentadíssimo universo saudável.